Esperar pelo nascimento de um
bebê costuma ser a alegria de toda a família. Até naquelas situações em que a
gravidez veio de repente, dando um susto na mamãe, papai e avós, a chegada de
uma criança geralmente reaviva a esperança de todos. E em muitos casos a
gestação é amplamente planejada e meticulosamente cuidada. O pré-natal ocupa a
mente da mãe com exames cada vez mais meticulosos. Pode-se agendar o parto,
tudo dentro de uma aparente tranqüilidade e estabilidade. Nada poderá
atrapalhar os meses de felicidade que se espera após o nascimento do filho que
está por vir. Dificuldades? Espera-se apenas por algumas noites mal dormidas,
pelo choro do bebê, as dores causadas pelas cólicas e as fraldas espalhadas
pela casa, que diminuem com o tempo, sendo aos poucos substituídas pelas
mamadeiras de suco, a primeira papinha, os primeiros sorrisos, as primeiras
gargalhadas.
Mas nem sempre é assim. Às vezes
percebe-se que alguma coisa não está bem. E isso não estava nos planos. Se tudo
foi tão planejado e esperado, por que a mãe está tão triste? Por que chora
tanto? Às vezes não quer cuidar do bebê, sentindo-se impotente para isso;
outras vezes fica obsessivamente apreensiva e preocupada e não deixa ninguém
chegar perto da criança. Os momentos que deveriam ser de alegria tornam-se de
apreensão e de preocupação. A família quer ajudar, mas geralmente não está
preparada para isso, e acaba, mesmo sem perceber, fazendo cobranças para a mãe,
que sofre ainda mais, pois percebe que está sendo julgada.
Em uma sociedade que cobra cada
vez mais da mulher, que precisa ser eficiente em tudo, fica difícil
desmistificar a idéia do instinto materno. Cobra-se das mulheres a absoluta
auto-suficiência quando o assunto é ser mãe. Dificuldades emocionais na
gravidez e futuramente, no puerpério (pós-parto), geram preconceitos, e é muito
difícil para a mãe assumir que está tendo dificuldades para aceitar e conviver
com essa fase de sua vida.
Longe de ser apenas um paraíso, a
gravidez e o pós-parto são ricos de emoções intensas e contraditórias, nem
sempre reconhecidas pelas mulheres. O amor, a alegria e a esperança podem
conviver com o medo, a culpa, a ansiedade e a tristeza. Reconhecer e aceitar
esses sentimentos, que são normais nessas fases, é essencial para preservar a
saúde da mãe e do bebê.
Uma gestação pode propiciar
mudanças intensas no mundo psíquico da mulher. Assim como a adolescência e o
climatério (menopausa), é uma fase caracterizada por intensas transformações
biológicas e emocionais. Ao ser mãe, a mulher muda seu papel social e familiar,
mas nem sempre ela está pronta para essas mudanças. E o pior é que, sentindo
culpa e com medo
de críticas, a gestante ou a mãe
sofre sozinha, achando que é somente ela que tem dificuldades com a questão da
maternidade.
Ela pode também sentir-se
bastante assustada diante de seus sentimentos, já que geralmente o assunto
depressão pós-parto surge na mídia na sua possível versão mais dramática
possível: quando a mãe não resiste ao sofrimento emocional e maltrata o seu
próprio filho.
Durante a gestação a mulher pode
ter dúvidas em relação à sua capacidade materna, pode ter medo de morrer no
parto, de abortar ou de estar gerando uma criança defeituosa. Pode ficar
ansiosa se vai conseguir amamentar o bebê, e também pode ficar preocupada com a
sua imagem corporal, e ter receio de não conseguir recuperar a forma de seu
corpo.
O que as mulheres geralmente não
sabem é que tudo isso, embora difícil, pode ser considerado normal. É normal a
ambivalência dos sentimentos: querer e não querer o bebê (principalmente nos
primeiros meses de gestação), gostar e não gostar de estar grávida, querer que
ele nasça logo, mas ao mesmo tempo recear pelo momento do nascimento. Essa
polaridade dos sentimentos, e geralmente com a negação dela, geram os conflitos
emocionais, e podem culminar, por exemplo, em depressão pós-parto, com
conseqüências graves para a saúde psíquica da mãe e para o seu vínculo com o
bebê.
O pós-parto abrange o período de
cerca de quarenta dias após o parto e é um período muito intenso de
sentimentos. Há bastante euforia e alívio por ter passado pela experiência do
parto e ter visto o filho nascer saudável, pode-se ter medo de não ser capaz de
cuidar bem do bebê e não conseguir ser para ele uma boa mãe e também é possível
os pais sentirem decepção com o filho recém-nascido, pelo fato de ser diferente
do que se esperava – o filho imaginado e desejado é substituído pelo filho
real.
Mas como reconhecer a depressão
pós-parto e saber quando buscar ajuda?
No pós-parto podem ocorrer três
situações: uma tristeza passageira chamada baby-blues, a depressão pós-parto e
um estado mais intenso e mais grave, a psicose puerperal.
A situação mais comum é o
baby-blues, que se inicia na primeira semana após o parto e pode durar de
poucas horas a poucos dias, geralmente desaparecendo no primeiro mês. É uma
situação comum, caracterizado por choro, humor instável e depressivo e
ansiedade da mãe. O baby blues não deixa seqüelas negativas, geralmente se
resolve pós si só e atinge a maioria das mulheres no pós-parto – entre 70 a 90%
delas.
Até mesmo as mulheres que adotam
filhos passam por esse período, portanto, não é apenas hormonal. O
blues-puerperal pode ser considerado um modo de comunicação entre a mãe e o
bebê. Acredita-se que seja o recém-nascido que desencadeia o baby-blues na mãe,
como via de
comunicação com ela, e se essa
tentativa de comunicação fracassar, todo o corpo dele passará a ser lugar da
linguagem, via seus sintomas, como por exemplo, as cólicas do bebê, as
dificuldades para dormir, a recusa da alimentação.
Já o diagnóstico da depressão
pós-parto usualmente requer que a mulher apresente alterações de humor e também
alteração de outros sintomas, como o sono, apetite, distúrbios psicomotores,
fadiga e idéias suicidas. É um episódio depressivo que atinge aproximadamente
10 a 15% das mulheres que têm filhos, inicia-se geralmente entre a quarta e a
oitava semana após o parto, mas os sintomas podem surgir em algum outro momento
do primeiro ano de vida do bebê e podem durar por vários meses. É uma situação
que traz muitas conseqüências, e a primeira delas é o próprio sofrimento da
mulher, seguida das evidências crescentes que a depressão materna influencia
negativamente o relacionamento mãe-bebê e o desenvolvimento cognitivo e social
da criança
Se o baby-blue não traz consequências
sérias, no outro extremo de gravidade está a psicose puerperal, que é um
distúrbio psiquiátrico severo e raro, atingindo duas em cada 1000 parturientes,
no qual junto aos sintomas depressivos acrescentam-se as ilusões e alucinações
e as funções maternas são seriamente prejudicadas. E se o baby-blues resolve-se
por si, a depressão pós-parto e a psicose puerperal não. Nesses casos, as
mulheres precisam se desvencilhar do mito da eterna heroína e da mãe toda
poderosa que sempre cuida de todos, para buscar ajuda profissional e ser, por
sua vez, cuidada. A família, e dentro dela, o pai, pode ajudar bastante ao
perceber a fragilidade emocional da gestante ou da mulher com o novo bebê e lhe
dar a devida atenção e cuidado. Deve lembrar que após o parto ela merece tanta
atenção quanto antes e deixar de lado críticas e cobranças diante de sua
instabilidade e dificuldades emocionais.
Mesmo nos casos em que a mãe
esteja muito bem e também cuidando de modo tranqüilo do bebê, ela precisa ter
alguém que possa lhe servir de apoio, já que ela também está em um momento
emocional bastante regredido. E se essa regressão emocional é o que permite a
mãe atender às solicitações do filho, entender as suas necessidades, adequar o
seu ritmo de sono ao dele e estar sempre pronta e sempre alerta para
socorrê-lo, ela também precisa de quem lhe cuide, de quem lhe garanta conforto,
proteção e harmonia nessa fase tão sensível e peculiar de sua vida.
Regina Maschio –
Psicóloga
CRP. 06/85279 -
remaschio@hotmail.com